quarta-feira, 9 de abril de 2014

No Rastro dos Gigantes



Uma reação que muitos paleontólogos brasileiros com certeza enfrentam é a pergunta: “Mas existiram dinossauros no Brasil?”- as mídias nacional e estrangeira têm feito um bom trabalho em divulgar o que já foi encontrado no exterior, mas pouca atenção é direcionada em apresentar ao público o que se tem por aqui.
Um grande passo foi a montagem e exposição de uma réplica do esqueleto do Uberabatitan riberoi (Salgado & Carvalho, 2008) na Casa da Ciência da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Esse saurópodo pertencente ao grupo Titanosauria é o maior dinossauro já encontrado em território brasileiro, medindo 12 metros de comprimento, podendo ter chegado a 20 metros.

Réplica de Uberabatitan riberoi em exposição na Casa da Ciência. Perdoem ele por ser tímido e não querer se virar para a foto (Fonte: http://www.casadaciencia.ufrj.br).

Desenho esquemático feito por Felipe Elias mostrando a escala de tamanho do animal e quais ossos foram recuperados (Fonte: está na própria imagem).





Titanossauros, assim como todos os saurópodos, eram dinossauros de extremos, podiam alcançar 4 a 34 metros de comprimento como o Futalognkosaurus dukei (Calvo et al, 2007), mas ainda sim não eram os maiores esses eram os saurópodos Diplodocoidea, e o título de maior dos maiores fica para o seu representante que podia chegar a 60 metros de comprimento, Amphicoelias fragillimus (Cope, 1877). De modo geral, titanossauros eram quadrúpedes herbívoros com crânio pequeno em relação ao corpo, pescoço e caudas alongados e caracterizados por uma forte procelia nas vértebras caudais (face anterior côncava e posterior convexa). Alguns exemplares como Saltasaurus apresentam indícios de uma possível armadura dérmica (Bonaparte & Powell, 1980).

A disputa do maior dos maiores. O único Titanosauria concorrendo é o Argentinosaurus huiculensis. Sauroposeidon é um Brachiosauridae, Supersaurus  um Diplodocidae e Mamenchisaurus  é um Mamenchisauridae (Fonte: Wikipedia).



O grupo teria se originado durante o Eo-Cretáceo, duvidosamente derivados dos plateossauros e existido até o final do período, constituindo um dos grupos de maior sucesso evolutivo dentro de Saurischia e representando cerca de dois terços dos saurópodos do período (Bertini, 2000). Seus fósseis de titanossauros têm aparecido com grande freqüência no território brasileiro, especialmente no Grupo Bauru, a mais extensa seqüência sedimentar continental de idade cretácia da América do Sul, possuindo 350.000Km², que aflora nos estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e São Paulo.O Grupo Bauru por sua vez é dividido nas formações Araçatuba, Marilia, Adamantina e Uberaba (Fernandes & Coimbra, 2000).
O primeiro indício de titanossauros no Grupo Bauru foram vértebras caudais procélicas encontradas na Formação Adamantina e originalmente atribuídas a um crocodiliforme (Pacheco, 1913), foram mais tarde descritas como pertencentes a Titanosaurus cf. T. australis por Huene (1929). Algum tempo depois, Antarctosaurus brasiliensis foi encontrada nessa mesma formação e descrito por Arid & Vizotto (1971), atualmente, no entanto, é considerado um Nomem Dubium, um termo para deixar claro que os paleontólogos não tem mais certeza se ele realmente é uma espécie válida ou um nome diferente dado a uma espécie já descrita. O principal problema, como o leitor poderá ver na imagem abaixo, é que os únicos materiais encontrados e usados na descrição são as extremidades do úmero e fêmur esquerdos, nenhum pouco diagnósticos para o grupo.

Antarctosaurus brasiliensis, somente as epífises (extremidades) do úmero e fêmur recuperado. Uma diagnose válida para espécie necessitaria, pelo menos, de vertebras caudais.

Com o tempo mais fósseis foram sendo descobertos, o primeiro osteodermo encontrado em território nacional atribuído a um titanossauro foi encontrado na região de Peirópolis, Formação Uberaba e descrito por Azevedo & Kellner em 1998. E em 1999, Gondwanatitan faustoi é descoberto na cidade de Alvares Machado e descrito também por Kellner & Azevedo. No mesmo ano foi encontrado em Monte Alto, SP, o primeiro registro do Gênero Aelosaurus previamente citados e parcialmente descritos por Bertini et al (1999a, b) e Bertini et al (2000). No Município de Uberaba duas espécies de titanossauros foram previamente descritas: Baurutitan britoi e Trigonosaurus pricei (Campos et al., 2005; Kellner et al., 2005).

Baurutitan britoi, perceba que é conhecida toda uma sequencia de vértebras caudais.

Trigonosaurus pricei


Em 1958 durante a construção de uma estrada de ferro entre Adamantina e Irapurú, foram encontradas seis vértebras caudais anteriores bem preservadas, duas hemapófises e um fêmur isolado que mais tarde vieram a ser descritos como pertencentes a Adamantisaurus mezzalirai (Santucci & Bertini, 2006) em homenagem a seu descobridor o paleontólogo Mezzalira, talvez uma das figuras mais importantes na paleontologia da Bacia Bauru. Também nesse ano o Maxakalisaurus topai foi encontrado na Serra da Boa Vista, MG (Kellner et al, 2006).

Adamantisaurus mezzalirai, as vértebras desse animal estão em exposição no Museu do Parque da Água Branca em São Paulo.

Com isso temos pelo menos 5 espécies formalmente descritas desse grupo somente para o sudeste do Brasil! E algumas ainda não descritas como o titanossaurideo de Marília, um dos exemplares mais completos encontrados na localidade. Tais espécies ainda carregam caráter social significativo para as comunidades aonde são encontradas, cidades como Monte Alto, Marília e Peirópolis criaram seus próprios museus atraindo o turismo e gerando empregos, ao mesmo tempo em que contribuem para a divulgação da Paleontologia brasileira.

Referências Bibliográficas
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